Há gente assim, com vidas que nunca mais acabam. Seres com a estranha capacidade de se reinventarem mesmo no disparate.
De renascerem sempre, após cada uma das muitas mortes que vão tendo em vida. Tolos, há outros que lhes invejam este castigo como se fora uma gracinha para entreter os amigos nas noites frias de inverno ou nas amenas cavaqueiras de verão. São os tolos quatro-estações, que por desconhecerem a primavera das ideias estão condenados ao outono da mediocridade para sempre.


sexta-feira, 16 de novembro de 2007

4 salas, 4 filmes

Vi dos melhores filmes da minha vida no Quarteto. Lembro-me de quando apareceu aquele conceito de cinema, qualidade na tela mais do que nas paredes em si. Era o tempo do Monumental, do S.Jorge, do Império, Condes, Roma, Odeon, que chegava ao fim. O conceito de sala de cinema sofria uma modificação tão profunda como a mudança social e cultural que chegava a Portugal. Acabavam-se os foyers com bufete, para chocolates e cafézinho nos intervalos. Acabavam-se os grandes espaços, espaços largos como o largo de estatuaria que existia no Monumental ao cimo das escadarias que conduziam ás varandas com vista para o Saldanha. Era o fim dos tapetes e o princípio das alcatifas, cada vez com menos pelo e mais sintético.

Os anos 80 foram anos de glória para o Quarteto e para os cinéfilos portugueses. Passou por lá uma boa parte do que melhor se fazia em 35mm, longas e curtas, sessões e festivais. Pedro Bandeira Freire pontificava no gosto e na escolha. Devo à sua memória a justiça do reconhecimento da qualidade de ambos. Passei tardes e tardes de sala para sala, de filme para filme, a tentar acertar as horas das sessões. Vi filmes/marca na minha cultura enquanto ser humano e enquanto cinéfilo apaixonado. Conheci tertúlias e clubes de poetas vivos que calcorreavam a Estados Unidos da América dia sim dia sim, apesar de morarem em Moscavide ou na quinta parte dos infernos. Tínhamos todos cartão passageiro frequente, tipo passe social sem pipocas, só com a arte maior da vida em imagens.

Ontem, ao que parece, o Quarteto fechou. Dizem que é por pouco tempo, só para uns arranjos a que foram obrigados pela Inspecção das Actividades Culturais. Faço votos que assim seja. E faço outros tantos votos que os novos donos daquela janela a mantenham limpa e arejada para mais gerações. Gente feliz que não conhecerá nunca a diferença das cores que o Quarteto trouxe para o Portugal a preto e branco.

«O cinema Quarteto, em Lisboa, foi hoje encerrado por falta de condições de segurança, sobretudo de prevenção de incêndios, disse à Lusa a inspectora-geral das Actividades Culturais, Paula Andrade. "Falta um sistema automático de detecção de incêndios, há reposteiros de material altamente inflamável a tapar caminhos de evacuação e revestimentos de paredes e tectos em material também muito inflamável".»

4 comentários:

Maria, Flor de Lotus disse...

Passei por cá seguindo o seu comentário deixado na Grande Loja do Queijo Limiano.
Gostei muito deste seu espaço.
Se não me levar a mal vou linká-lo e colocá-los nos blogs amigos no meu MARIA.
Quanto ao Cinema Quarteto subscrevo-o totalmente.
Saudações
Maria

Maria, Flor de Lotus disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
AC disse...

Espermos que não seja mais uma Lin Po Po,para abrir com artesanato industrial do oriente.

Rui Vasco Neto disse...

maria,
volte sempre, que faz falta.

hertz,
não, ao que parece, notícia já de hoje, os proprietários garantem a reabertura em menos de duas semanas.
vamos ver. vamos ver?