Há gente assim, com vidas que nunca mais acabam. Seres com a estranha capacidade de se reinventarem mesmo no disparate.
De renascerem sempre, após cada uma das muitas mortes que vão tendo em vida. Tolos, há outros que lhes invejam este castigo como se fora uma gracinha para entreter os amigos nas noites frias de inverno ou nas amenas cavaqueiras de verão. São os tolos quatro-estações, que por desconhecerem a primavera das ideias estão condenados ao outono da mediocridade para sempre.


quarta-feira, 30 de janeiro de 2008

Carta aberta ao Zero

Meu amigo, meu bom, querido e quase único amigo: peço-lhe calma, reflexão e serenidade. Julgo que posso falar por todos os criativos deste país quando lhe imponho esta súplica. Por todos os jornalistas, humoristas, piadistas, polemistas, caricaturistas, outros artistas e até turistas e pessoal da São Caetano à Lapa no geral. Não pense em abandonar-nos a todos. Se lhe passou pela cabeça escrever uma carta igual ou parecida com a que o nosso António mandou ao chefe, depois do chefe supremo lhe ter puxado as orelhas em discurso de Ano Novo (imperdoável o timming, eu sei) eu cá sugiro ponderação e reflexão profunda. Homem, é a sobrevivência da crítica portuguesa quem lho implora, nesta hora de perda de uma figura de topo, segundo lugar destacado, do anedotário nacional. Teremos sempre (aparentemente, pelo andar da coisa) o grande Alberto João, lá isso parece certo, temos também Mendes Bota, agora remix, e aqui e ali vão despontando novas promessas, sim, mas o amigo Zero não conquistou com tanto afinco esse lugar de cromo difícil na imensa colecção lusitana para agora atirar, pela janela da demissão, uma promissora carreira de pushing bag dos punhos de renda editoriais. Seja forte, carago! Vá-se a nós.

Aceite o conselho desta ruim cabeça e não desista da sua cruzada, missão, obessão, paixão, compulsão ou peregrinação à senhora da asneira que Portugal se habituou a acompanhar como um morango sem açucar que é diariamente servido com o café e sem cigarrinho para rebater, por cada vez que o amigo abre a boca. Faça o amigo muitos mais daqueles brilharetes de autoritarismo e palermice com que conseguiu o feito notável de piorar o que já era mau, pese necessário. Insista o caríssimo em ser odioso que o papel fica-lhe uma segunda pele, tem até a indispensável bigodaça. Seja sempre um arauto das más novas, ao invés de as insinuar no nosso viver com a vaselina dos espertos. Seja mau, se não conseguir manter o péssimo com que se notabilizou. Sempre ganha o Portugal dos pobres que na falta do pão assim enchem a barriguinha de riso com a rábula revisteira do seu trabalho. Sempre dá alma e coragem ao país dos tristes que somos sem si. Mas não desista, por favor, por mim, por todos, pelo PSD, pelo Dr. Portas, pelo Bloco e por todos os tijolos nacionais, não cruze os braços, não se apague por mais que eu sopre. O que diria Menezes na sua ausência, deixado a sós com uma obrigação de competência e acerto? E sobre que escreveria eu, não me diz? Não vacile, não hesite, não transija. Pesa nos seus ombros uma responsabilidade de igual quilate à do Bond, o agora casadoiro James. O amigo é único, precioso, é o zero da ambição lusitana. Não é um zero qualquer. É o nosso zero.

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