Há gente assim, com vidas que nunca mais acabam. Seres com a estranha capacidade de se reinventarem mesmo no disparate.
De renascerem sempre, após cada uma das muitas mortes que vão tendo em vida. Tolos, há outros que lhes invejam este castigo como se fora uma gracinha para entreter os amigos nas noites frias de inverno ou nas amenas cavaqueiras de verão. São os tolos quatro-estações, que por desconhecerem a primavera das ideias estão condenados ao outono da mediocridade para sempre.


quarta-feira, 10 de outubro de 2007

Era uma vez na América...

Ele há coisas levadas da breca. Pequenos enganos, enfim. Mal-entendidos. Nada que não se resolva. O homem da foto da direita é Abu Ayyub Al-Masri, referenciado pelo Departamento de Estado norte americano como sendo um dos altos responsáveis da Al-Qaeda. O homem da foto da esquerda é Khaled El-Masri, um empresário alemão de origem libanesa sem quaisquer ligações ao terrorismo, como foi agora amplamente comprovado. Há três anos atrás a CIA apanhou um julgando que estava a agarrar o outro.
Foi durante uma viagem de negócios à Macedónia que Khaled foi raptado do avião onde seguia e levado para uma prisão clandestina no Afeganistão onde ficou detido, sem qualquer assistência legal, durante vários meses. Foi abusado física e psicológicamente, interrogado sob tortura e sodomizado com vários objectos, por várias pessoas, entre outras meiguices. Um dia foi solto sem quaisquer explicação. Faz favor de sair, tenha uma vida feliz. Em liberdade, chegou por si só às explicações que ninguém lhe deu: era Abu Ayyub Al-Masri e não Khaled El-Masri que a CIA queria apanhar. Foi um pequeno lapso, portanto.

Vá lá perceber-se porquê, Khaled ficou um nadita aborrecido com a América e interpôs em 2005 uma acção judicial no Supremo Tribunal dos Estados Unidos a requerer um pedido formal de desculpas e 75.000 dólares de indemnização por danos sofridos. A resposta do Supremo chegou ontem. Em nome do segredo de Estado, o órgão de justiça suprema nos EUA negou sequer estudar o assunto e fechou para sempre o caso em termos judiciais. Sem fundamentar ou explicar a sua decisão. Por conta do patriotismo.Tenha paciência, basicamente.

Alemão de origem libanesa, Khaled não devia conhecer a proverbial expressão americana 'Shit happens'. Agora, seguramente, já a conhece. Esgotada a hipótese de uma reparação, fica a história para contar mil vezes. O tempo passou e ele já se senta sem dor. Shit happens. Ele há coisas levadas da breca. Pequenos enganos, enfim. Mal-entendidos. Coincidências. Nada que não se resolva.
RVN

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