Há gente assim, com vidas que nunca mais acabam. Seres com a estranha capacidade de se reinventarem mesmo no disparate.
De renascerem sempre, após cada uma das muitas mortes que vão tendo em vida. Tolos, há outros que lhes invejam este castigo como se fora uma gracinha para entreter os amigos nas noites frias de inverno ou nas amenas cavaqueiras de verão. São os tolos quatro-estações, que por desconhecerem a primavera das ideias estão condenados ao outono da mediocridade para sempre.


terça-feira, 9 de outubro de 2007

Morrer é outra coisa

Quando eu comecei a ver bem como se fazia televisão, quem fazia televisão era o Raul Durão. Ele e outros, claro. Mas nesse ponto exacto das minhas recordações o homem da altura era o Raul. Foi uma referência incontornável, para mim e para muitos como eu, que achavam ter jeitinho para a coisa. Tiques e trejeitos, colocação de voz e postura, rodapés de ironia fina ou notas de humor, tudo era muito ele, muito o retrato do tempo televisivo da altura. Quando anos depois entrei para a RTP, a primeira equipa que integrei foi a do Raul Durão, já nas tardes do Canal 1 mas activo e coordenador. Com o passar do tempo a sua imagem esfumou-se do écran e com toda a lógica. Com a lógica perversa do audiovisual, que o Raul conhecia de gingeira. É assim. Faz parte. A gente estrebucha mas habitua-se a qualquer prateleira se não quiser cair no chão e ficar por lá. Toda a gente, que o chão é duro para todos.
Raul Durão morreu hoje, diz o site da RTP e eu fiquei a saber há dois instantes. Um para me lembrar dele, sem estremeços de histeria. E o outro para arquivar a memória, com amizade e respeito, naquela galeria de figuras de sempre que encontro por aí, sempre iguais, pelas esquinas da minha televisão. Morrer é outra coisa.

RVN

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