Estava eu aqui a mexer nos arquivos de coisas já publicadas e saltou-me à vista este texto que não resisto a reproduzir, hoje, 22 de Outubro de 2007, dia em que toda a gente e mais alguém quer ouvir toda a gente e mais alguèm sobre escutas telefónicas. Que como toda a gente sabe, não existem no nosso país.
Perdoarão que seja coisa já servida (Jornal dos Açores, 16/Fev/2006) e que seja sobre o famigerado caso Casa Pia e escutas telefónicas, assuntos da altura.
Mas não sei porquê, mesmo vinte longos meses passados, tenho cá para mim que não vos irá saber a requentado.
O BALDE E OS SALPICOS
Já era de esperar que quem metesse a mão no balde do vício pedòfilo que existe em Portugal ia acabar por salpicar tudo a torto e a direito mal começasse a agitar a pasta viscosa que encontrasse lá dentro. E assim aconteceu, com efeito. Desde o caso Farfalha, nos Açores, ao processo Casa Pia no coração da República, que as investigações abrangeram culpados e inocentes, como em qualquer outra investigação, para posteriormente ficarem reduzidas supostamente apenas aos presumíveis culpados. Isto esperamos todos nós, claro. O sistema judicial terá provido de meios bastantes os investigadores, enquadrando as suas autorizações na moldura legal que assegura o respeito pelos direitos, liberdades e garantias que são ponto assente na lei fundamental portuguesa. Com certeza absoluta. E tudo estaria bem se acabasse bem, o que é manifestamente impossível em convulsões sociais deste género, sobretudo nos dias de hoje, tempo de comunicação e informação global á velocidade de um instante. Resultado? O caso do ‘envelope 9’ por exemplo.
Cinco disquetes com registos de chamadas feitas pelos telefones de altas figuras do Estado português e escutadas pelos investigadores sem autorização de juiz algum. A prova mais que provada que existem escutas e vigilâncias ilegais em Portugal feitas ao bel prazer de cidadãos, que trabalham nas polícias, a outros cidadãos que nem sonham estar a ser espiados, incluindo um Presidente da República, nada mais, nada menos! Resultado? Deu aquilo que estava no balde. Já cheirava a qualquer coisa no dia em que Jorge Sampaio fez o seu tradicional discurso de abertura do ano judicial e usou as palavras quase todas para falar de escutas e direitos civis, vigilâncias e cuidados. Mas onde a coisa atingiu o ventilador, a altura em que o cheiro virou pivete e ficou mesmo insuportável foi quando o jornal “24Horas”, essa espécie de fossa da informação, contou a história a toda a gente. Aí sim, transbordou. Resultado? Três juizes, um mandato de busca e apreensão e mais um batalhão de polícias. Tudo para saber quem fez as escutas ilegais? Claro que não. Tudo para saber como é que o “24Horas” soube, isso sim. Claro que sim.
O Ministério Público nacional tem a sua reputação a prémio com este processo da Casa Pia. O próprio Estado português tem a sua reputação a prémio em toda esta história. Alguém duvida? A prisão de Carlos Cruz envolveu emocionalmente o povo português, como se previa, e a prisão de Paulo Pedroso mexeu directamente com os políticos portugueses, como se temia. A dimensão do caso ultrapassou fronteiras, como era lógico que acontecesse. A lista das gaffes e disparates desta investigação dava quase tantas páginas como o processo em si, e até o Procurador Geral da República deu um generoso contributo para o mega-anedotário deste mega-processo. Muito boa gente viu o seu nome maculado e muito pedófilo empedernido ficou de fora e continua a procurar meninos e meninas na bolsa da miséria nacional. A busca ao “24Horas”, essa fossa de informação, por mais legal e até justificada que possa ser, não deixa de escamotear o mais importante do episódio ‘envelope 9’. O que de facto interessa saber é quem fez as escutas e se as continua a fazer. Esta diligência só vem mostrar que quem fez as escutas e as continua a fazer é afinal aquilo que de facto não interessa que se saiba. A ninguém, pelos vistos.
RVN
(J.A., 16/Out/06)
2 comentários:
Tudo isto existe, vinte meses depois, tudo isto é fado ... (cadê o Sporting ?) ... Tudo isto é triste ... Ai quem me dera !!!!
20 meses, é verdade, como o tempo passa..
O Sporting está em Fátima, dizem as más línguas. Paulo Bento não quis sair de lá sem fazer a promessa solene de mudar o penteado se o avião para Roma chegasse a horas. Vamos ter risco ao meio por mais tempo, como se soube agora.
rvn
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