Há gente assim, com vidas que nunca mais acabam. Seres com a estranha capacidade de se reinventarem mesmo no disparate.
De renascerem sempre, após cada uma das muitas mortes que vão tendo em vida. Tolos, há outros que lhes invejam este castigo como se fora uma gracinha para entreter os amigos nas noites frias de inverno ou nas amenas cavaqueiras de verão. São os tolos quatro-estações, que por desconhecerem a primavera das ideias estão condenados ao outono da mediocridade para sempre.


sexta-feira, 1 de fevereiro de 2008

Maria, simplesmente Maria.

Quis o destino que o nosso zé primeiro fosse um Aníbal e só o nosso zé segundo um José. Mas, cauteloso com os equilíbrios, Deus brindou-nos com uma Maria a sério, cepa genuína da vetusta dona encrenca nacional, tão cantada na nossa literatura e tão presente no nosso imaginário que não tem erro reconhecê-la ali. Na autoridade, na afirmação, na oportunidade, no nariz. A nossa Primeira Maria é a mais maria de todas as marias que já foram nossas Primeiras. E a presidência da República mudou muito, desde o circo das tartarugas nas Seichelles. Vestiu uma batinha mais assim, sei lá, um meio andar de lado, um trejeito exterior para cada emoção interior. E uma frontalidade de aldeia, polida de fino por cima do afianço, mas pronta a saltar em incontáveis e insuspeitos botões.

É mais minha senhora, agora, no estender da roupa íntima presidencial. Mas nem por isso menos doutora. O Palácio de Belém é hoje sede de uma join venture de parceiros especializados com práticas complementares, não mais o palco para um solo de carisma. Se o nosso Zé fala, a nossa Maria sublinha, para bem ou para mal, seja contra ou a favor. Humaniza o chefe, chefia o humano. Ao vivo e a cores, sem meias tintas. Até a crónica de imprensa teve de ajustar o tom do cor-de-rosa habitual com uns pozinhos de alfarroba e sapiência doméstica, para a foto dizer com o texto. Sem por isso ter que calçar chinela e vestir avental ou escrever em letras grandes, que a nossa Maria não é ignorante nem é parva. E nem por isso é menos senhora que as outras Marias, apenas diferente. Apenas ela.

Tem um estilo próprio, chamemos-lhe assim. Uma pose mista de ar de enfado e dores nos calos que tuteia o ministro das Finanças com a autoridade de quem dorme com quem sabe mesmo da poda e não se discute. É uma montra luminosa do sentir presidencial e a imagem de um serão aconchegado com conversa de Estado e bróculos na mesa da cozinha. Maria Barroso ficaria impávida, José Ritta sorriria o de sempre, Manuela Eanes baixaria o olhar. Apostaria ser isto o que faria cada uma das três Marias se o seu marido dissesse uma piadinha pública sobre a polémica ASAE. A nossa Maria foi um espectáculo à parte, uma rábula de Marcel Marceau. É sempre, de resto. Marca o passo do Presidente nas alcatifas do mundo. Sendo que ele já mostrou saber de que lado tem o pão a teiguinha, e arrisca mais na taxa de juro que na contrária da sua maria. E quem lhe pode levar a mal, meu Deus?

A nossa Maria não é boa nem é má, é ela e pronto. Eu cá respeito e aceito quem ela é, tal como é e sendo quem é, a Maria certa do e para o seu zé, cuja popularidade cresce em todas as sondagens. E é sem sombra de dúvida, para o bem e para o mal, para o pior e para o melhor, a Maria mais maria de todas as marias que já foram nossas Primeiras Marias nesta república de abril. Isso é bom ou é mau?

5 comentários:

samuel disse...

É bau!
O presidente Aníbal andou com sorte na piada sobre a ASAE. Primeiro, porque teve graça, o que é once in a lifetime. Segundo, porque sua Maria em vez de insinuar que "lá está ele com as suas maluquices, não liguem", podia bem ter apontado o pelegar à boca, sinal internacional para "está outra vez com os copos", pois aí alguém podia ter acreditado...

Anónimo disse...

Brilhante :))))))!!!!!!!
abreijos...
(outra) Maria.

Anónimo disse...

é mau!
mas o texto é brilhante :)))))!!!!
abreijos...
(outra) Maria.

Anónimo disse...

Com esses trajos de cocotte a maria ainda pode "dar o cavaco"!...

Vasquinho,
gosto da nova pintura. É menos agressiva para vista.
jocas.

Rui Vasco Neto disse...

sam,
pois, ou à testa, tipo 'não liguem, é maluco...'

mariiiiia,
gadinho, viu?

mifas,
bom saber, amiga. fica assim, então, se tu dizes.